Até ao Chão

Deserto... em chão cinzento e poeirento, rachado por esterilidade, pairo, agoirento, com o meu manto preto.

Olho-te com desaprovação perante a tua conformidade e desafio o teu conforto apático, a tua mediocridade... meu pequeno porco... suíno mesquinho.

Queres provar a minha carne... ver o que há por baixo do negro... mas a sombra da tua cruz moraliza-te e torna-te pedófilo, o sagrado e católico pedófilo, profícuo através do silêncio de mil almas, cobertas por lágrimas.

Há algo que grito, e da minha garganta sai uma mão negra, pela boca... vomito a captura do teu espírito... com o intuito de te lançar em possessão demoníaca.

Agachado, nu, no meio do escuro, cobres os ouvidos... tentativa vã de calar os gritos que verbalizam o teu nome... e o que fizeste em vida!

Vives onde anteriormente condenaste...

Cego, tudo à volta é negrume... mãos... tantas mãos a tocarem-te, a agarrarem a tua carne... puxam-na e arrancam-na.

Sentes as fibras musculares a desfiarem-se e desfazes-te em atroz sofrimento! Impulsos e alfinetadas elétricas... os tendões e nervos estão a ser mastigados por bocas invisíveis... por dentes temíveis.

Arrancam-te as pálpebras para que vejas como as tuas vítimas viam... cada vez que as sodomizavas no confessionário... no bestiário da igreja onde erguias a tua falsa moral.

Difícil de respirar... sentes a pressão na cabeça a aumentar... estão-te a apertar o pescoço... e o sangue quer continuar a correr.

A pressão vai diminuir rapidamente, pois duas veias rebentaram na tua cabeça... e o brotar profuso do sangue quente sobre o teu rosto disforme faz-te sonhar com a desejada morte.

No meu mundo não se morre... estás sempre no limiar dela, mas não a abraças.

Estás em poça de sangue, és nada e em nada estás... és ossos no meio de uma massa gelatinosa de carne... a estremecer de ciática.

Não, não ficarás assim para sempre... podes ficar descansado... tudo se recomporá novamente apenas para o desmanche recomeçar.

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